domingo, 18 de março de 2012

O CASAMENTO HOMOAFETIVO NO DIREITO BRASILEIRO

A Constituição Federal, em seu art, 5°. afirma que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza...". Esse simples dispositivo, somado ao princípio da dignidade da pessoa humana, seria suficiente para resolver inúmeras discussões jurídicas. Entretanto, vivemos numa sociedade submetida a um sistema legislativo complexo, que deve ser cuidadosamente analisado.
O histórico julgamento da ADI 4277 e da ADPF 132, onde o Supremo Tribunal Federal, de forma justa e corajosa reconheceu a existência de entidade familiar nas uniões homoafetivas, dando-lhes o mesmo amparo legal do art. 1723 do Código Civil, abriu a discussão acerca da possibilidade ou não do casamento homoafetivo no Direito brasileiro. A legislação brasileira, após o reconhecimento pelo STF das uniões homoafetivas, está a reconhecer também a legalidade do casamento entre pessoas do mesmo sexo?
Alguns doutrinadores, como por exemplo, os doutores Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, entendem não ser possível o casamento homoafetivo, visto que o casamento é um negócio solene que deve obedecer todas as formalidades previstas em lei. Defendem que o casamento entre pessoas do mesmo sexo deve ser regulamentado por uma nova lei. Apesar de ser uma leitora fervorosa de seus trabalhos, ouso discordar da opinião de meus amados mestres. No Capítulo referente a Celebração do Casamento, onde estão previstas as formalidades que devem ser observadas para validar o casamento, o legislador não menciona a palavra homem e mulher, apenas utiliza o termo “nubentes”, “contraentes” e “cônjuges”. Dessa forma, pode-se interpretar que os termos utilizados pelo legislador podem fazer referência ao casamento entre um homem e uma mulher, ao casamento entre duas mulheres ou ao casamento entre dois homens. Em outros capítulos verificamos a utilização do termo “homem” e “mulher” como, por exemplo, o art. 1565 do mesmo diploma legal, porém, tal artigo não está inserido no capítulo referente à celebração do casamento, e, por essa razão não seria essencial a diversidade de sexo para tornar o casamento existente.
Outrossim, aplicando-se por analogia o julgamento da ADI 4277 e da ADPF 132, juntamente com o princípio da dignidade da pessoa humana, da igualdade, do respeito as diferenças e da proteção à família, a tendência é de se reconhecer o direito ao casamento celebrado entre pessoas do mesmo sexo. A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, autorizou em outubro de 2011, um casamento civil entre duas pessoas do mesmo sexo. Colaciono a Ementa do REsp 1183378 / RS, Ministro Rel. Luis Felipe Salomão. Publicado em 01/02/2012

DIREITO DE FAMÍLIA. CASAMENTO CIVIL ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO (HOMOAFETIVO). INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 1.514, 1.521, 1.523, 1.535 e
1.565 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. INEXISTÊNCIA DE VEDAÇÃO EXPRESSA A
QUE SE HABILITEM PARA O CASAMENTO PESSOAS DO MESMO SEXO. VEDAÇÃO
IMPLÍCITA CONSTITUCIONALMENTE INACEITÁVEL. ORIENTAÇÃO
PRINCIPIOLÓGICA CONFERIDA PELO STF NO JULGAMENTO DA ADPF N. 132/RJ E
DA ADI N. 4.277/DF.
1. Embora criado pela Constituição Federal como guardião do direito
infraconstitucional, no estado atual em que se encontra a evolução
do direito privado, vigorante a fase histórica da
constitucionalização do direito civil, não é possível ao STJ
analisar as celeumas que lhe aportam "de costas" para a Constituição
Federal, sob pena de ser entregue ao jurisdicionado um direito
desatualizado e sem lastro na Lei Maior. Vale dizer, o Superior
Tribunal de Justiça, cumprindo sua missão de uniformizar o direito
infraconstitucional, não pode conferir à lei uma interpretação que
não seja constitucionalmente aceita.
2. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento conjunto da ADPF n.
132/RJ e da ADI n. 4.277/DF, conferiu ao art. 1.723 do Código Civil
de 2002 interpretação conforme à Constituição para dele excluir todo
significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e
duradoura entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar,
entendida esta como sinônimo perfeito de família.
3. Inaugura-se com a Constituição Federal de 1988 uma nova fase do
direito de família e, consequentemente, do casamento, baseada na
adoção de um explícito poliformismo familiar em que arranjos
multifacetados são igualmente aptos a constituir esse núcleo
doméstico chamado "família", recebendo todos eles a "especial
proteção do Estado". Assim, é bem de ver que, em 1988, não houve uma
recepção constitucional do conceito histórico de casamento, sempre
considerado como via única para a constituição de família e, por
vezes, um ambiente de subversão dos ora consagrados princípios da
igualdade e da dignidade da pessoa humana. Agora, a concepção
constitucional do casamento - diferentemente do que ocorria com os
diplomas superados - deve ser necessariamente plural, porque plurais
também são as famílias e, ademais, não é ele, o casamento, o
destinatário final da proteção do Estado, mas apenas o intermediário
de um propósito maior, que é a proteção da pessoa humana em sua
inalienável dignidade.
4. O pluralismo familiar engendrado pela Constituição -
explicitamente reconhecido em precedentes tanto desta Corte quanto
do STF - impede se pretenda afirmar que as famílias formadas por
pares homoafetivos sejam menos dignas de proteção do Estado, se
comparadas com aquelas apoiadas na tradição e formadas por casais
heteroafetivos.
5. O que importa agora, sob a égide da Carta de 1988, é que essas
famílias multiformes recebam efetivamente a "especial proteção do
Estado", e é tão somente em razão desse desígnio de especial
proteção que a lei deve facilitar a conversão da união estável em
casamento, ciente o constituinte que, pelo casamento, o Estado
melhor protege esse núcleo doméstico chamado família.
6. Com efeito, se é verdade que o casamento civil é a forma pela
qual o Estado melhor protege a família, e sendo múltiplos os
"arranjos" familiares reconhecidos pela Carta Magna, não há de ser
negada essa via a nenhuma família que por ela optar,
independentemente de orientação sexual dos partícipes, uma vez que
as famílias constituídas por pares homoafetivos possuem os mesmos
núcleos axiológicos daquelas constituídas por casais heteroafetivos,
quais sejam, a dignidade das pessoas de seus membros e o afeto.
7. A igualdade e o tratamento isonômico supõem o direito a ser
diferente, o direito à auto-afirmação e a um projeto de vida
independente de tradições e ortodoxias. Em uma palavra: o direito à
igualdade somente se realiza com plenitude se é garantido o direito
à diferença. Conclusão diversa também não se mostra consentânea com
um ordenamento constitucional que prevê o princípio do livre
planejamento familiar (§ 7º do art. 226). E é importante ressaltar,
nesse ponto, que o planejamento familiar se faz presente tão logo
haja a decisão de duas pessoas em se unir, com escopo de constituir
família, e desde esse momento a Constituição lhes franqueia ampla
liberdade de escolha pela forma em que se dará a união.
8. Os arts. 1.514, 1.521, 1.523, 1.535 e 1.565, todos do Código
Civil de 2002, não vedam expressamente o casamento entre pessoas do
mesmo sexo, e não há como se enxergar uma vedação implícita ao
casamento homoafetivo sem afronta a caros princípios
constitucionais, como o da igualdade, o da não discriminação, o da
dignidade da pessoa humana e os do pluralismo e livre planejamento
familiar.
9. Não obstante a omissão legislativa sobre o tema, a maioria,
mediante seus representantes eleitos, não poderia mesmo
"democraticamente" decretar a perda de direitos civis da minoria
pela qual eventualmente nutre alguma aversão. Nesse cenário, em
regra é o Poder Judiciário - e não o Legislativo - que exerce um
papel contramajoritário e protetivo de especialíssima importância,
exatamente por não ser compromissado com as maiorias votantes, mas
apenas com a lei e com a Constituição, sempre em vista a proteção
dos direitos humanos fundamentais, sejam eles das minorias, sejam
das maiorias. Dessa forma, ao contrário do que pensam os críticos, a
democracia se fortalece, porquanto esta se reafirma como forma de
governo, não das maiorias ocasionais, mas de todos.
10. Enquanto o Congresso Nacional, no caso brasileiro, não assume,
explicitamente, sua coparticipação nesse processo constitucional de
defesa e proteção dos socialmente vulneráveis, não pode o Poder
Judiciário demitir-se desse mister, sob pena de aceitação tácita de
um Estado que somente é "democrático" formalmente, sem que tal
predicativo resista a uma mínima investigação acerca da
universalização dos direitos civis.
11. Recurso especial provido.

sexta-feira, 16 de março de 2012

DEFENSORIA DATIVA EM SANTA CATARINA

O STF julgou inconstitucional a prática da defensoria dativa por advogados nomeados pela Ordem dos Advogados do Brasil em Santa Catarina, ao julgar procedentes as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI)n°s. 3892 e 4270.
A defensoria pública, segundo o art. 134 da Constituição Federal é " instituição essencial à função jurisdicional do EStado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus dos necessitados, na forma do art.5°,LXXIV". No Estado de Santa Catarina a defensoria pública não existe, sendo que, a população carente recebe prestação jurídica gratuita por meio de advogados dativos indicados pela seccional catarinense da Ordem dos Advogados do Brasil.
Tal procedimento funciona da seguinte forma: o cidadão procura a OAB de sua cidade e é encaminhado para um advogado dativo (que efetuará o trabalho sem cobrar qualquer valor do cliente). Posteriormente, após o término do processo, o juiz arbitra um valor a título de honorários, o qual é pago pelo Estado de Santa Catarina. Apesar da inconstitucionalidade, agora declarada, de tal prática, acreditamos ser essa a forma mais eficiente de oferecer prestação jurídica de qualidade a população hipossuficiente.
O advogado inscrito na OAB seccional Santa Catarina não é obrigado a prestar tal tipo de assistência judiciária, ou seja, somente aqueles que dispõem de tempo e interesse em auxiliar os mais necessitados cadastram-se como dativos. Assim, entendemos não existir discriminação no tratamento entre o cliente particular
e o cliente dativo, uma vez que ninguém é obrigado a atender nesses casos peculiares. Outrossim,sabemos que o Estado não conseguirá manter um número de defensores públicos proporcionais ao número de demandas, o que acarretará morosidade nos processos em que figuram como partes a população já sofrida com sua situação econômica desprivilegiada.
Agora, finda a discussão, resta torcermos para que a implementação da defensoria pública ocorra com sucesso, pois, o objetivo de toda celeuma jurídica não deve resumir-se a interesses particulares ou artimanhas políticas, mas, sim deve ter por objetivo primordial garantir a aplicabilidade da Justiça.